Jackson Cionek
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O Cérebro Coletivo: Hyperscanning e o Nascimento da Neurociência Decolonial

O Cérebro Coletivo: Hyperscanning e o Nascimento da Neurociência Decolonial

Por Jackson Cionek

1. Consciência em primeira pessoa

Nos meus conceitos, a consciência nunca é isolada — ela vibra entre corpos, palavras e silêncios. Quando observo trinta pessoas conectadas pelo fNIRS, percebo não apenas curvas hemodinâmicas, mas correntes de pertencimento.
Cada sujeito é um território pulsante. Quando respiram juntos, algo maior emerge: um corpo coletivo.
Essa experiência é o ponto de partida da Neurociência Decolonial — uma ciência que não pretende capturar o outro, mas sentir-se com ele, mapear a vida que pensa através dos corpos.


2. O hyperscanning como espelho da coletividade

Com o avanço dos equipamentos como o Brite Ultra, tornou-se possível realizar medições simultâneas de até 30 pessoas interagindo em tempo real.
Cada participante veste um sensor que lê as variações de oxigenação cerebral, captando os fluxos de luz que revelam o ritmo do pensar-junto.
Essa tecnologia permite que vejamos algo que antes era apenas intuição: a sincronia neural do pertencimento.

Os estudos mais recentes mostram que, quando dois ou mais cérebros se alinham emocionalmente ou cooperam em uma tarefa, há aumento da coerência entre áreas frontais e temporais — um acoplamento dinâmico que reflete o corpo-território em ação, a biologia da empatia.
Com trinta pessoas, podemos agora mapear comunidades de consciência, ver quando um grupo entra em ritmo compartilhado e quando se fragmenta.


3. Fruição, zonas e consciência corporal

Nos meus conceitos, descrevo três zonas metabólicas da consciência:

  • Zona 1 – Operação e tensão. O corpo realiza tarefas, consome energia, executa com precisão.

  • Zona 2Fruição fisiológica. O organismo entra em estado de fluxo, atenção aberta e integradora.

  • Zona 3 – Sequestro ideológico ou ansioso. O corpo repete padrões, reage sem presença.

Essas zonas não são estados morais, mas condições biofenomenológicas — modos de estar no mundo.
Durante o hyperscanning, observamos que grupos que conseguem migrar da Zona 1 para a Zona 2 — do fazer para o fruir — apresentam maior sincronia inter-cerebral e menor entropia nas variações de HbO e HbR, sinalizando um campo coletivo de atenção equilibrada.
É o momento em que o pensar se transforma em sentir-pensar, onde o corpo e a mente são indissociáveis.


4. Papel, Pedra e Tesoura: modos do conectoma

As Zonas descrevem o metabolismo da consciência, mas a mente também se organiza em modos de conectoma, que chamo de Papel, Pedra e Tesoura.
Esses modos não se equivalem às Zonas; eles operam em outro eixo — o da topologia das redes cerebrais.

  • Papel é o modo integrador, a rede que envolve e acolhe.
    Representa o grupo que escuta, compartilha e mantém o sentido de totalidade.

  • Pedra é o modo de ataque-defesa e replicação automática.
    É o “pensar rápido” de Daniel Kahneman (Sistema 1): eficiente, veloz, mas sem metacognição.
    Em Pedra, executo com maestria o que já sei, porém com menor abertura ao novo.

  • Tesoura é o modo da ruptura criativa, o corte que gera reorganização e insight.

Durante um experimento coletivo, podemos observar quando o grupo entra em Pedra-Replicadora: as redes frontais se estabilizam, a coerência aumenta e a variabilidade hemodinâmica cai.
É o cérebro em alto desempenho, mas sem reflexão.
Quando o contexto muda, Tesoura se manifesta — há aumento súbito de conectividade entre áreas associativas, maior latência e expansão da entropia neural.
E, finalmente, Papel restaura o equilíbrio, tecendo novamente o pertencimento.

As Zonas mostram como a consciência está metabolicamente;
os modos Papel–Pedra–Tesoura mostram como o conectoma se organiza nessa consciência.

Juntos, eles formam o mapa dinâmico da mente viva.


5. O grupo como organismo neurobiológico

No hyperscanning de trinta pessoas, podemos estudar o quorum sensing humano — a forma como cérebros se auto-organizam como bactérias inteligentes.
Quando todos os participantes entram em Zona 2, o padrão de coerência inter-cerebral se expande, criando o que chamo de campo de Fruição coletiva:

  • Menor variabilidade fisiológica,

  • Maior estabilidade de fase,

  • Padrões oscilatórios que lembram o acoplamento respiratório-cardíaco.

Esse estado pode durar segundos ou minutos, mas é nesse intervalo que a inteligência coletiva acontece.
O grupo se torna um organismo de decisão distribuída, onde a soma das consciências é menor que o fluxo que as une.


6. Pertencimento e corpo-território

Em termos ameríndios, isso é o Corpo-Território: o sentir que não separa o dentro e o fora.
Durante o hyperscanning, cada pulsação de oxigênio carrega essa memória biológica do vínculo.
Quando o grupo sincroniza, não há mais um “eu” que lidera; há um campo que respira.

Estudar esse fenômeno é dar um passo decisivo para uma neurociência decolonial:
uma ciência que não hierarquiza o observador e o observado, mas reconhece que o conhecimento nasce da relação.
A cada instante em que trinta cérebros se conectam, o planeta nos observa de volta.


7. Do replicador à metacognição

A partir dos meus conceitos, podemos pensar o modo Pedra como um replicador: útil para a sobrevivência e a performance, mas incapaz de reflexão.
É o piloto automático da cultura, o movimento do corpo sem consciência de si.
Ao introduzirmos micro-pausas respiratórias e estímulos de atenção plena (ou Fruição), o grupo pode transitar de Pedra para Tesoura e, em seguida, para Papel — recuperando a capacidade metacognitiva.
Essa transição é observável nos dados fNIRS: a reabertura da variabilidade de fase e o aumento da conectividade fronto-parietal.
A ciência, então, torna-se um ato de re-ligar, não de medir.


8. O nascimento de uma neurociência decolonial

A Neurociência Decolonial nasce quando a tecnologia não serve mais para dominar, mas para testemunhar a vida.
O hyperscanning de trinta pessoas permite observar o que as tradições ameríndias sempre souberam:
que a mente é uma trama compartilhada,
que o pensamento não é propriedade do cérebro, mas um movimento do coletivo.

O fNIRS torna visível aquilo que as danças ancestrais já expressavam: pensar é mover-se junto.
Ao unirmos a luz infravermelha da tecnologia ocidental ao calor biológico do pertencimento, nascem novas possibilidades para o estudo da consciênciasem centro e sem hierarquia.
É assim que o Cérebro Coletivo emerge: não como soma de indivíduos, mas como um metabolismo de Fruição.


9. Referências (2020 – 2025)

  1. Czeszumski, A., Eustergerling, S., Lang, A., Menrath, D., Gerstenberger, M., Schreiber, F., Zuluaga R., König, P. (2020). Hyperscanning: A Valid Method to Study Neural Inter-brain Underpinnings of Social Interaction. Frontiers in Human Neuroscience.

  2. Barreto, C., Lima, C. F., et al. (2021). A New Statistical Approach for fNIRS Hyperscanning to Predict Student Brain Activity from Teacher Brain Activity. Frontiers in Neuroscience.

  3. Li, R., Xia, S., et al. (2021). Dynamic inter-brain synchrony in real-life inter-personal interaction: An fNIRS study. Neuroscience & Biobehavioral Reviews.

  4. Hamilton, A. F. C. (2021). Hyperscanning: Beyond the Hype. Neuron.

  5. Czeszumski, A., et al. (2022). Cooperative Behavior Evokes Interbrain Synchrony: An fNIRS Hyperscanning Meta-analysis. Frontiers in Human Neuroscience.

  6. Wang, H., et al. (2025). An fNIRS hyperscanning study on the influence of team type and sex factors on athletes’ interpersonal trust behaviours. Scientific Reports.

  7. Carollo, A., et al. (2024). Hyperscanning literature after two decades: Review and methodological advances. NeuroImage.

  8. Müller, H., Büchel, D., et al. (2025). Monitoring cognitive load while playing exergames in older adults: an EEG study. Scientific Reports.

  9. Esteves, D., Andrade, A., Vourvopoulos, A. (2025). When embodiment matters most: a confirmatory study on VR priming in motor imagery BCI training. Frontiers in Human Neuroscience.

  10. Reiser, J. E., Chuang, L. L., Wascher, E. (2025). Audiovisual Cues and Task-Switching While Walking: An EEG/ERP Study. Psychophysiology.

  11. Zappa, A., León-Cabrera, P., François, C. (2025). Alpha and beta desynchronization during consolidation of newly learned words. NeuroImage.

  12. Müller, C. O., Bannier, E., Maurel, P. (2025). Evaluating the effects of multimodal EEG-fNIRS neurofeedback for motor imagery. PLOS One.




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Jackson Cionek

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